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Obra encomendada por Felicitas e Matteo Bürgler para o Klangforum Wien (um ensemble de música contemporânea sedeado na Konzerthaus de Viena), See Saw foi estreada muito recentemente (a 4 de Fevereiro de 2010) no Musikgebouw de Amesterdão. Foi justamente o Klangforum Wien a tocar, sob a direcção de Sylvain Cambreling.
A ideia de base da peça traduz, precisamente, a estética de fragmentação a que se aludia na parte introdutória desta nota de programa. De acordo com Aperghis, a peça consiste numa “multiplicidade de movimentos minúsculos que se sucedem e influenciam (...) num jogo de espelhos. São como “inícios” inacabados que não têm senão uma existência efémera (...). O paradoxo consistiu em formar um único grande andamento a partir destas ideias”.
Em que consistem esses movimentos minúsculos? Qual é o seu conteúdo? Na verdade, destacam-se nesta peça algumas ideias musicais, verdadeiras personagens desta narrativa quebrada e imprevisível. Cada uma dessas personagens tem um carácter diferenciado. Assim, encontramos: i) uma nota repetida num registo extremamente agudo, nos violinos (que soa como um verdadeiro silvo); ii) movimentos ondulantes, geralmente num espaço relativamente curto, que são quase sempre sobrepostos em vários instrumentos: essa sobreposição é feita, às vezes, com ritmos diferentes (produzindo um efeito fluido, que dá a impressão de uma massa ou plasma sonoro); outras vezes, tendo todos os instrumentos o mesmo ritmo (o que produz um efeito mais mecânico, que pode sugerir a operação de uma máquina implacável); iii) por fim, notas curtas, mais ou menos vezes repetidas, que são peremptoriamente atacadas com o máximo de intensidade.
Ao longo da peça, estas ideias musicais são apresentadas em múltiplas combinações e sobreposições, jogando-se muito com a escolha dos instrumentos. Assim se sucedem, de modo sempre imprevisível, momentos com solistas, duos, pequenos coros de cordas, madeiras ou metais, ou tutti.
Nenhum fragmento é especialmente desenvolvido. Certas vezes (e logo no início), mesmo dentro de um certo momento, há pequenos cortes, como se estivéssemos a ver uma imagem, relativamente imóvel, que é aqui e ali interrompida, ficando por instantes apenas um fundo preto.
Daniel Moreira, 2012