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1. Quiet, effervescent
2. Grave, restrained
No primeiro dos seus crepusculares “Four Quartets”, T.S.Eliot medita sobre a relação entre tempo (sugerindo um contínuo – ou uma amálgama – entre passado, presente e futuro) e transcendência. A um dado momento do poema, Eliot oferece-nos a ideia de um ponto fora da voragem do tempo; um ponto de contemplação e síntese: “the still point of the turning world”. Esta imagem agradou-me: em parte como projecção da sequência de estruturas circulares em torno das quais a peça está organizada, e que vão evoluindo em espiral até à sua extinção, ou substituição; em parte, porque gosto de a imaginar a descrever o silêncio dos materiais, essa dimensão quase secreta da linguagem musical (onde, para Eliot, “the dance is”); por fim, como um comentário à própria natureza da música: a criação de um tempo fora do tempo.
Tive o privilégio de ser amigo do Manuel Dias da Fonseca, que me honrou com o seu apoio incondicional, e apreço, pela minha música. Tenho muita pena que não possa ouvir a estreia desta obra, que é escrita em sua memória. Quando o Manuel gostava muito de uma peça minha, vinha ter comigo no final do concerto e dizia: “vá-se lixar!”– e aquela interjeição era um misto de afecto, orgulho e comoção que só podiam existir em alguém com um amor tão grande à música – e um respeito tão profundo pelos que a fazem – como o Manuel. Quero imaginar que, se ainda estivesse connosco, seria esta a reacção dele na noite de hoje.
Vasco Mendonça, 2016