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A música de Anton Webern é muitas vezes apresentada como o expoente máximo da síntese em contextos atonais e dodecafónicos seriais. Contudo, esses modelos só foram adoptados pelo compositor após o seu contacto com Arnold Schoenberg. Até então, o estilo juvenil de Webern encontrava-se fortemente enraizado nas práticas tardo-românticas germânicas. Nascido em Viena, e pertencente a uma família com posses, Webern estudou piano e violoncelo a título privado. O compositor passou grande parte da sua juventude em Graz e em Klagenfurt. Nesse período, a sua família manteve uma propriedade rural, Pregelhof, e passava lá algumas temporadas. Em 1902 Webern matriculou-se na Universidade de Viena, onde estudou musicologia com Guido Adler. Quatro anos depois, concluiu a sua tese de doutoramento sobre o contrapontista do Renascimento Heinrich Isaac. Nesse período, Webern deslocou-se a Berlim, contemplando ter aulas de composição com Hans Pfitzner, um dos mais importantes pedagogos germânicos da altura. Contudo, incompatibilidades estilísticas fizeram com que retornasse a Viena, onde se tornou aluno de Arnold Schoenberg no Outono de 1904.
Im Sommerwind foi composto pouco antes desse encontro determinante. Desse modo, enquadra-se num estilo tardo-romântico que é pouco associado a Webern. Aliás, a obra foi estreada em Maio de 1962, muito tempo depois da morte do compositor, e editada quatro anos depois. A estreia esteve a cargo da Orquestra de Filadélfia, sob a direcção de Eugene Ormandy, no Primeiro Festival Internacional de Webern, realizado em Seattle. A realização desse festival, organizado por Hans Moldenhauer, reflecte a relevância da obra de Webern para os compositores desse período, fortemente influenciados pelo serialismo. A memória do período americano de Arnold Schoenberg ainda se encontrava muito presente e Stefan Wolpe, antigo aluno de Webern, tinha ensinado diversos compositores importantes nos Estados Unidos da América. Paralelamente, a dominância dessa tendência estilística nos departamentos de composição das universidades americanas reforçou a presença da obra dos compositores associados à Segunda Escola de Viena nesse contexto.
A obra enquadra-se num estilo tonal característico do final do Romantismo, e recorre a uma grande orquestra. Apesar de uma das maiores influências dos compositores da Segunda Escola de Viena ter sido Gustav Mahler, o “idílio para grande orquestra” Im Sommerwind encontra-se mais próximo do tardo-Romantismo de Richard Strauss. A obra é inspirada num poema do político e escritor alemão Bruno Wille (1860-1928) que narra um passeio pelos bosques e campos num dia de Verão. Essa visão idílica da Natureza é traduzida para orquestra sinfónica por Webern de forma quase directa. Inclusivamente, pensa-se que a obra possa ser uma evocação do ambiente rural vivido pelo compositor na Pregelhof familiar.
Im Sommerwind tem início com uma massa sonora estática em que se destacam os trilos de vários instrumentos solistas. Esse dado aponta para um aspecto que será recorrente na obra de Webern, o recurso a uma orquestração quase camerística. Aqueles motivos solistas vão transitando entre os diversos instrumentos, numa animada troca de materiais, ilustrando os sons do campo. Im Sommerwind tem um carácter descritivo e uma forma descontínua e fragmentária. Todavia, o seu cariz rapsódico é unificado por alguns temas que perpassam recorrentemente o tecido orquestral. Se a condução melódica, o trabalho harmónico e o recurso a uma grande orquestra remetem para os poemas sinfónicos de Richard Strauss, a abordagem descritiva e narrativa e a redução de meios apontam para o estilo de Webern. Esse estilo é reforçado pela colorística e quase pontilhista orquestração, um elemento que se tornará central em toda a obra do compositor.
João Silva, 2016