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Sete perguntas a Philip Venables
“O público como artista” é o mote deste projecto, que esbate as fronteiras entre artista e ouvinte. O que significa isto no que respeita ao papel do compositor? Que elementos do projecto te interessaram e como abordaste esta encomenda?
A minha abordagem foi pensar na ideia de “o público como sujeito” em vez de “artista”. Há muito que sou fã de teatro colaborativo que interage com o público, fazendo dos seus membros personagens do enredo. Também me interesso bastante pela música e o teatro politicamente comprometidos, pelo que, nesta peça, junto os elementos das duas áreas. Quero saber o que o público pensa sobre a questão do género na sociedade de hoje, brincar com isso, envolver as pessoas e fazer uma peça interactiva a partir desse tema.
Além de serem vários ensembles a interpretar esta peça, o principal foco é a comunicação e a interacção com o público. De que forma o público é envolvido na acção musical?
The Gender Agenda é basicamente um concurso televisivo ou talk show. Por isso vamos convidar pessoas do público para participar nas actividades, questionários ou entrevistas no palco. Podemos ainda ter momentos de voxpop com o público nos seus lugares. Também incluí um coro comunitário de voluntários, que vai desempenhar um papel muito especial para chegar ao público e incentivá-lo a participar.
Como preparam o público?
Antes do concerto realizam-se workshops com o coro comunitário para ensaiar a parte musical. Para além disso vamos fazer ensaios para alguns membros de forma a recrutar voluntários do público para as várias actividades do concurso. Há também um ‘aquecimento’ com o apresentador, uma espécie de preparação do ambiente para um concurso televisivo de estúdio.
De que forma o público pode influenciar a peça [antes e durante a performance]? Qual é o rácio entre os elementos pré-determinados e aqueles que o público pode influenciar?
Isso funciona também como num concurso televisivo, ou seja, a ‘grelha’ da peça/concurso já está pré-determinada mas o conteúdo – o que é discutido, as opiniões que emergem, etc. – vem maioritariamente do público. O material musical é relativamente fixo, durante o concurso, mas utilizamos vídeos em tempo real que mostram o público que está na sala – de novo, como num concurso televisivo.
Como lidas com o desconhecido – a imprevisibilidade do público – na composição?
Julgo que o desconhecido é a parte mais estimulante. Nunca sabemos como é que um elemento específico do público vai reagir a uma determinada questão ou tarefa: às vezes a reacção pode não ser assim tão interessante, às vezes pode ser bem-humorada ou surpreendente. A parte interessante é que é algo vivo, desconhecido, e toda a gente que vê sabe isso. E realmente aumenta a tensão e a expectativa no público durante a interpretação da peça, o que é muito interessante de ver.
Esta peça é apresentada sucessivamente em quatro cidades europeias. Imaginas que a diversidade de contextos culturais e relações com a música leve os públicos a agir e reagir de formas diferentes?
Sim, espero que sim, até certo ponto. Julgo que depende das questões ou tarefas que colocamos ao público. Depende também do apresentador de cada actuação, já que o seu estilo vai definir o tom da apresentação.
As expectativas para estes concertos diferem das que terias para um concerto tradicional?
Não, as minhas expectativas são similares àquelas que teria numa obra convencional. Sempre procurei que o meu trabalho fosse envolvente, emocionante e cheio de suspense – sejam obras interactivas ou não. De alguma forma, qualquer música deveria envolver o público, senão como comunica? O meu objectivo é que o público se sinta sempre envolvido no enredo da peça.
© Ensemble Modern Magazin, Janeiro 2018, n.º 47
Tradução: Liliana Marinho